DESMATAMENTO DA AMAZÔNIA E AS SECAS DO SUDESTE (SIC 2015)

Por: Hugo Alves Braga e Luiz Carlos Baldicero Molion

Instituto de Ciências Atmosféricas, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, Alagoas, Brasil

INTRODUÇÃO

 Os anos de 2013 e 2014 foram anos fortemente marcados por secas severas na região Sudeste e tal fenômeno foi anunciado na mídia como tendo sido provocado pelo desmatamento da Floresta Amazônica. O objetivo deste estudo é demonstrar que tal afirmação carece de base científica por meio da avaliação da variabilidade interanual da convergência do fluxo de umidade na Região Amazônica e a “exportação” do fluxo de umidade para outras regiões do País.

Sabe-se que a Floresta Amazônica é uma região muito úmida, portanto o entendimento do ciclo hidrológico e do balanço de água dessa floresta tropical é fundamental quando se tem por objetivo estudar a distribuição pluvial no País. A umidade passa pela Amazônia é resultante do transporte de umidade vinda do Oceano Atlântico Norte e o fluxo de umidade que sai na fronteira sul é composto de uma parcela do fluxo de umidade de entrada adicionado do fluxo de umidade resultante de complexas interações floresta-atmosfera, ou seja, da água reciclada pela evapotranspiração de floresta. Como base nessas premissas, foram calculados os fluxos de convergência de umidade na Região e o fluxo exportado através de sua fronteira sul.

METODOLOGIA

 Calculou-se a divergência do fluxo de umidade na Região Amazônica, seguindo a metodologia descrita por Satyamurty et al (2009) que utilizaram a integral de linha fechada (Teorema de Gauss), ou seja:

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onde L é a distância ao longo da fronteira fechada em volta da área; p, a pressão atmosférica; q, a umidade específica; V, o vetor vento horizontal, e g é a aceleração da gravidade. Se a área considerada é retangular, a integral fechada é quebrada em quatro partes, fronteiras norte (N), oeste (W), sul (S) e leste (E) da caixa, convertendo-se em

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A caixa se estende latitudinalmente do equador 0° a 12,5°S, com comprimento Y e longitudinalmente de 45°W a 75°W, com comprimento X. Os somatórios verticais ficam restritos entre  = 100 kPa e p = 30kPa, uma vez a umidade acima de 30kPa é muito pequena.

Os dados utilizados são do conjunto de Reanálises NCEP/NCAR, dispostos em pontos de grade de 2,5°x 2,5° de latitude/longitude e o período estudado é entre 1999 e 2014. Entende-se que os dados de Reanálises apresentam limitações, mas, particularmente os dados de umidade são mais confiáveis atualmente e é de fácil acesso.

RESULTADOS

A convergência média anual do fluxo de umidade para o período 1999-2014 resultou em 1,04×108 kg/s que corresponde a apenas 20% do fluxo médio de umidade que entra na Amazônia. Na Figura 1, mostra-se a variabilidade interanual da convergência do fluxo de umidade (kg/s). Nota-se, na figura, que os maiores valores de convergência do fluxo de umidade foram em anos de La Niña, ou seja, em 1999, 2008 e 2011 de acordo com o Índice Oceânico de El Niño (ONI/CPC/NCEP/NOAA).

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Na Figura 2, é mostrada a variabilidade interanual do fluxo de umidade médio anual “exportado” pela fronteira sul do domínio geográfico adotado (12,5°S; 45°W-75°W) no período 1999-2014. O fluxo médio anual foi igual a 2,59x kg/s para o período e sua variabilidade anual é notável, tendo sido os maiores fluxos médios anuais registrados em 2014 [=3,45x kg/s] e 2013[=3,08x kg/s].

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A partir desses resultados de umidade exportada pela Amazônia, pode se concluir que o fluxo de umidade exportada pela a Floresta Amazônica não foi a causa dos períodos de estiagem observados nas Regiões Sudeste e Centro Oeste nos anos de 2013-2014. Para essa confirmação, foram analisados os campos sinóticos médios de Janeiro a Março, trimestre chuvoso para o estado de São Paulo.

Campo Ômega se refere à velocidade vertical do vento (ω, dado em Pa/s). Os valores negativos representam movimento ascendente do ar (instabilidade) e os valores positivos, movimentos descendentes de ar seca que criam um sistema de alta pressão à superfície (estabilidade atmosférica). Na Figura 3, está representada a velocidade Ômega média de Janeiro a Março do ano de 2013 no eixo de 23ºS demonstrando valores positivos, de 5°S a 20°S, portanto, estabilidade atmosférica. A faixa de longitude utilizada foi 45ºW-50°W. Nota-se que os valores positivos atingiram mais o Centro Oeste e o norte do Sudeste.

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Figura 4 – Idem à Figura 3 mas para Jan – Mar 2014..

Radiação de Onda Longa Emergente (ROLE) é um campo indicador de maior ou menor atividade convectiva nos trópicos. Na Figura 5, estão representados os desvios de ROLE para o trimestre chuvoso do ano de 2014, onde valores positivos indicam baixa atividade convectiva enquanto valores negativos indicam alta atividade convectiva.

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Figura 5 – Desvios de Radiação de Onda Longa Emergente(ROLE) Jan-Mar 2014, indicando valores positivos na Região Sudeste , que sugere uma área de baixa atividade convectiva e, portanto, baixa nebulosidade.

CONCLUSÃO

 Conclui-se que a estiagem da Região Sudeste nos anos de 2013-2014 não foi provocada pela falta de umidade atmosférica na Região, proveniente da Floresta Amazônica e sim pela falta de mecanismos dinâmicos que convertessem a umidade em chuva. A análise sinóptica indica que um sistema de alta pressão, e a inversão psicrotérmica associada, dominou a Região Sudeste nesses anos durante a estação chuvosa.

Com a atual base de dados, esses resultados demonstram que o desmatamento atual da Floresta Amazônica não influi no fluxo de umidade que chega as Regiões Centro-Oeste e Sudeste do Brasil. É preciso ficar claro que, com isso, não se está avalizando o desmatamento da Amazônia.

 REFERÊNCIAS

KALNAY, E. e al. The NCEP/NCAR Reanalysis 40-year Project. Bull. Amer. Meteor. Soc., 77, 437-471, 1996.

SATYAMURTY, P; et al. Convergência do fluxo de umidade sobre a região amazônica nos anos contratantes 2005 e 2009. XVI CBMET, SbMET, Belém (PA), 2010.   Disponível em: http://www.sbmet.org.br/cbmet2010/artigos/377_45904.pdf >. Acesso em: 01 setembro 2015.

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